quinta-feira, 7 de março de 2024

Texto para resumo Jacinto Terlim 10C

 


Sim, quando Kant descreve a lei moral, descreve a consciência humana. Não podemos provar o que a consciência diz, mas sabemo-lo. - Por vezes, sou muito simpático para com os outros simplesmente porque é vantajoso para mim. Desse modo, posso ser popular. - Mas quando és simpática para com os outros apenas para seres popular, não estás a agir de acordo com a lei moral. Talvez não estejas a observar a lei moral. Talvez estejas a agir numa espécie de acordo superficial com a lei moral - e isso já é alguma coisa -, mas uma ação moral tem de ser o resultado de uma superação de ti mesma. Só quando fazes algo porque achas ser teu “dever” seguir a lei moral é que podes falar de uma ação moral. Por isso, a ética de Kant é frequentemente chamada “ética do dever”.

- Eu posso achar ser meu dever juntar dinheiro para a Cruz Vermelha ou a Caritas. - Sim, e o importante é tu fazeres uma coisa porque a achas correta. Mesmo quando o dinheiro que tu juntaste se extravia ou nunca alimente as pessoas que devia alimentar, tu cumpriste a lei moral. Agiste com a atitude correta e, segundo Kant, a atitude é decisiva para podermos dizer que uma coisa é moralmente correta. Não são as consequências de uma ação que são decisivas. Por isso, também dizemos que a “ética de Kant é uma ética da boa vontade”.
 - Porque é que era tão importante para ele saber quando é que agimos por respeito à lei moral? Não é mais importante que aquilo que fazemos ajude os outros? - Sim, Kant concordaria, mas só quando sabemos que agimos por respeito à lei moral é que agimos em “liberdade”.
- Só obedecendo a uma lei é que agimos em liberdade? Isso não é estranho?
- Segundo Kant, não. Talvez ainda te lembres que ele "postulou" o livre arbítrio do homem. Esse é um ponto importante, porque Kant achava que todas as coisas seguem a lei da causalidade. Como é que podemos ter livre arbítrio assim?
-Não me perguntes.
 - Aqui, Kant divide o homem em duas partes, e nisso faz lembrar Descartes, que afirmava que o homem era um ser duplo visto que tem corpo e razão. Enquanto seres sensíveis, estamos completamente sujeitos às leis imutáveis da causalidade, segundo Kant. Não decidimos o que sentimos; as sensações surgem necessariamente e influenciam-nos, quer queiramos quer não. Mas o homem não é apenas um ser sensível. Somos também seres racionais. - Explica-me isso! - Enquanto seres sensíveis, pertencemos à ordem da natureza. Por isso estamos sujeitos à lei da causalidade. Deste ponto de vista, não temos livre arbítrio. Mas enquanto seres racionais, participamos no mundo "em si" – ou seja, no mundo independente das nossas sensações. Só quando seguimos a nossa "razão prática" - que nos possibilita fazer uma escolha moral -, temos livre arbítrio. Se obedecermos à lei moral, somos nós que fazemos a lei pela qual nos orientamos.
-Sim, isso está certo. Eu digo - ou alguma coisa em mim diz - que eu não devo ser má para os outros. - Se decides não ser má - mesmo quando ages contra o teu próprio interesse - então estás a agir livremente. - Pelo menos, não somos livres e autónomos quando seguimos apenas os nossos instintos. - Podemos fazer-nos escravos de tudo. Sim, podemos inclusivamente ser escravos do nosso próprio egoísmo. Para nos elevarmos acima dos nossos instintos e vícios é necessário autonomia - e liberdade.
- E quanto aos animais? Eles seguem só os seus instintos e necessidades. Não têm essa liberdade de seguir uma lei moral?

- Não, é justamente esta liberdade que nos torna seres humanos. - Estou a ver. “

Jostein Gaarder, “ O Mundo de Sofia” p.296/297

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