quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Correção do teste 5 de Dezembro de 2011

I

1.Análise lógica do texto

Tema: A liberdade e a responsabilidade.

Problema: De que modo poderemos ser responsabilizados?

Tese principal: Só podemos ser responsabilizados por acções cuja escolha estava ao nosso alcance.

Argumento: Somos responsáveis porque temos sempre várias possibilidades de agir e escolhemos uma delas, logo porque é uma livre escolha é também uma escolha nossa e somos, por isso autores da acção. A liberdade traz consigo a responsabilidade, abusar dela traz o castigo, usá-la bem traz o mérito. Todavia não temos liberdade para escolher certas acções que não estão ao nosso alcance como passar férias na lua ou exigir a um indivíduo preso que seja pontual ao encontro fora da prisão.

Conceitos, liberdade, possibilidades, responsabilidade

2. Significa dizer que vivemos a nossa vida num espaço aberto de possibilidades, deliberamos sobre quais dessas possibilidades prosseguir e, tendo deliberado, optamos.



II

1. A Adriana estabeleceu a sua crença: Não concordo com as leis do trabalho. O seu desejo: Protestar. Escolheu a acção para o fazer, incendiar os caixotes, trata-se de uma acção que resulta de deliberação consciente, uma Acção voluntária. O agente é assim o autor moral e material da ação e, por isso responsável material e moral.
O Carlos cometeu uma acção equivocada. É fruto da negligência do agente, não sendo voluntário pegar fogo à floresta é voluntário atirar o cigarro para o chão. O agente devia prever as consequências do seu acto e não o fez. Sendo responsável material não tem responsabilidade moral pois não teve intenção de o fazer.

PERGUNTAS DE ESCOLHA MÚLTIPLA:


2. 1. Toda a acção é um acontecimento. Porque agir significa provocar uma alteração no mundo e no próprio agente.

2.2. Explica-se a acção através do motivo, isto é a resposta à pergunta “Porque fizeste isso? E da intenção: O que fizeste? Para quê o fizeste?

2.3. Algumas coisas que fazemos são acções. A diferença entre agir e fazer é que agir implica fazer algo, mas o contrário não é verdadeiro porque podemos fazer coisas como abrir e fechar as pálpebras sem agir, isto é sem o fazer consciente e intencionalmente. Fazer é condição necessária para agir mas não é suficiente.

2.4. Os enunciados que descrevem uma acção são:


“Apanhado pelo professor a copiar o Francisco mentiu”


“Joana não se inscreveu no curso de pintura.”

Ambas são acções voluntárias e conscientes, têm uma intenção e um motivo.

III3. Dizer que somos condicionados, que temos condicionantes, significa dizer que não existe uma liberdade ilimitada, que as nossas opções estão limitadas, por vezes muito limitadas dependendo da história, das condições sociais e económicas, da cultura, das condições hereditárias ,biológicas, psicológicas. Os homens são seres limitados às suas condições biológicas e físicas, por exemplo não temos força para levantar determinadas coisas, não temos inteligência para compreender tudo, não podemos viajar à velocidade da luz. Para além destas condicionantes biológicas e físicas temos constrangimentos sociais e culturais, deveres para com as leis que cumprimos para evitar um mal maior, hábitos adquiridos e socialmente aceites etc. Apesar da liberdade ser em abstracto um conceito magnífico é algo que procuramos ultrapassando estas condicionantes, lutando por melhores condições de vida, revoltando-nos contra certas leis injustas, isto é lutando por uma maior autonomia face às condicionantes que nos limitam.

«ACRASIA» fenómeno que se costuma designar (no senso-comum) por falta de força de vontade de um agente. Um agente tem falta de força de vontade se tiver o desejo de produzir um certo efeito e tiver a crença de que uma dada acção é a melhor forma de produzir esse efeito e, no entanto, não realizar a acção com a qual obteria o efeito desejado.

Suponhamos que desejas entrar na universidade e que acreditas que estudar arduamente é o melhor caminho para conseguir o que desejas. Se admitirmos que os seres humanos são racionais e visto que és um ser humano, qual é a única coisa que é racional fazeres? Estudar arduamente, claro. Que dizer se não o fizeres? Que tens falta de força de vontade. Que sofres de “acrasia”. Não sendo uma doença, é um fenómeno que intrigou os filósofos desde a antiguidade, porque viola uma das formas mais primárias de racionalidade. Como poderemos explicar o fenómeno da “ acrasia”
ANTÓNIO ACREDITA QUE O TABACO FAZ MAL
ANTÓNIO DESEJA SER SAUDÁVEL
ANTÓNIO FUMA

O fenómeno explica-se considerando que momentaneamente o agente está fora de si.Sabe das regras, não ignora a finalidade da acção, mas por não ter controle na sua vontade, não realiza o que pensou.É responsável por ter criado as circunstâncias em que sucumbe às paixões. Tem uma sabedoria latente mas não realizável.A sua acção é intencional, porque sabe que está a realizá-la, mas não se abandona a ela e em geral arrepende-se dela.



O Mito é uma forma primitiva de explicar a realidade porque recorre a seres imaginários e sobrenaturais que têm características humanas, projectando nos fenómenos exteriores da natureza, os sentimentos do homem. Daí ser uma explicação sincrética porque confunde a realidade observada com a imaginação que deriva da reacção humana ao desconhecido. É também uma explicação antropomórfica visto que dá características humanas a seres inanimados. A Filosofia utiliza os mitos para comunicar de forma simples ideias abstractas, de modo a tornar a explicação mais acessível e facilmente compreesível por todos.



IV

A Alegoria da Caverna é uma história imaginada por Platão no livro "A República" onde se pretende através de imagens, representar a condição humana face ao conhecimento. Descreve a situação de um grupo de homens numa caverna. Cada uma das imagens pretende representar um aspecto da realidade em que os homens vivem habitualmente assim como o seu conhecimento. Assim, primeiramente:
1. A descrição do mundo da caverna – o mundo sensível
Os prisioneiros representam a condição humana presa a ilusões e preconceitos. Agrilhoados ao corpo e às suas paixões.
2. Um dos prisioneiros consegue fugir e habitua-se progressivamente à luz e vê os objectos concretos. Começa por ver reflexos mas depois por etapas pode ver tudo, incluindo a origem da luz que é o próprio SOL (BEM). O Bem é a Verdade , Beleza e Proporção de todas as coisas. Significa que o conhecimento não é imediato e implica uma aprendizagem.
3. O Homem depois de se ter libertado, volta à caverna para libertar os outros, mas os outros não acreditam, presos ao hábito e incapazes de pensarem para além dele, matarão o libertado.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

A posição de Searle: Não podemos abandonar a convicção de liberdade

Até agora, pois, parece que não chegámos a lado nenhum no nosso esforço para resolver o conflito entre determinismo e a crença na liberdade da vontade. A ciência não deixa espaço para a liberdade da vontade e o indeterminismo na física não oferece para ela qualquer apoio. Por outro lado, somos incapazes de abandonar a crença na liberdade da vontade. Investiguemos ainda um pouco mais estes dois pontos.



Por que é que não há espaço para a liberdade da vontade na concepção científica contemporânea? Na física, os nossos mecanismos explanatórios básicos funcionam debaixo para cima. Isto é, explicamos o comportamento das características de superfície de um fenómeno, como a transparência do vidro ou a liquidez da água, em termos do comportamento de micropartículas como as moléculas. E a relação da mente com o cérebro é um exemplo de uma tal relação. As características mentais são causadas por e rea-lizadas em fenómenos neurofisiológicos, como discuti no primeiro capítulo. Mas deparamos com a causação da mente para o corpo, isto é, deparamos com a causação de cima para baixo, durante uma passagem de tempo; e deparamos com a causação de cima para baixo durante um certo tempo, porque o nível de cima e o nível inferior ocorrem simultaneamente. Assim, por exemplo, suponhamos que eu quero causar a libertação da acetilcolina neurotransmissora nas placas terminais do axónio dos meus neurónios motores; posso fazer isso mediante a simples decisão de levantar o meu braço e, em seguida, de o levantar. Aqui, o acontecimento mental, a intenção de levantar o meu braço causa o acontecimento físico, a libertação da acetilcolina — um caso de causação de cima para baixo, se é que alguma vez houve algum. Mas a causação de cima para baixo opera unicamente porque os acontecimentos mentais se baseiam na neurofisiologia para se iniciarem. Assim, em correspondência com a descrição das relações causais que vão de cima para baixo, há uma outra descrição da mesma série de acontecimentos, onde as relações causais ocorrem inteiramente no fundo, isto é, constituem totalmente uma questão de neurónios e de excitações neuronais nas sinapses, etc. Enquanto aceitarmos esta concepção do modo como a natureza opera, então não parece haver qualquer espaço para a liberdade da vontade, porque, nesta concepção, a mente pode apenas afectar a natureza enquanto é uma parte da natureza. Mas, se assim é, então, tal como o resto da natureza, as suas características são determinadas nos microníveis básicos da Física.



Eis um ponto absolutamente fundamental deste capítulo, deixem-me repetir. A forma de determinismo que, em última análise, é incómoda não é o determinismo psicológico. A ideia de que os nossos estados da mente são suficientes para determinar tudo o que fazemos é provavelmente falso. A forma incómoda de determinismo é mais básica e fundamental. Visto que todas as características de superfície do Mundo são inteiramente causadas por e realizadas em sistemas de microelementos, o comportamento dos microelementos é suficiente para determinar tudo o que acontece. Uma tal imagem de «pernas para o ar» do Mundo admite a causação de cima para baixo (as nossas mentes, por exemplo, podem afectar os corpos). Mas a causação de cima para baixo funciona apenas porque o nível superior já está causado por e realizado nos níveis inferiores.



Muito bem, abordemos a seguinte questão óbvia. O que é que na nossa experiência nos impossibilita abandonar a crença na liberdade da vontade? Se a liberdade é uma ilusão, por que é que é uma ilusão que, aparentemente, somos incapazes de abandonar? A primeira coisa a observar a propósito da concepção da liberdade humana é que ela está essencialmente ligada à consciência. Apenas atribuímos liberdade aos seres conscientes. Se, por exemplo, alguém construir um robô que cremos ser totalmente inconsciente, nunca sentiríamos qualquer inclinação a dizer que ele é livre. Mesmo se achássemos o seu comportamento aleatório e impredizível, não diríamos que actua livremente no sentido em que nos pensamos a nós mesmos como agindo livremente. Se, por outro lado, alguém construir um robô acerca do qual nos convencemos de que tem consciência, tal como nós temos então, seria, pelo menos, uma questão aberta de se ou não este robô tinha liberdade da vontade.



O segundo ponto a observar é que não é qualquer estado da consciência que nos fornece a convicção da liberdade humana. Se a vida consistisse inteiramente na recepção de percepções passivas, então, parece-me que nunca conseguiríamos formar a ideia da liberdade humana. Se nos imaginássemos a nós mesmos totalmente imóveis, totalmente incapazes de nos movermos e incapazes até de determinarmos o curso dos próprios pensamentos, mas, apesar de tudo, recebendo estímulos, por exemplo, suaves sensações dolorosas periódicas, não haveria a menor inclinação para concluirmos que temos liberdade da vontade.



Disse antes que a maior parte dos filósofos pensam que a convicção da liberdade humana está essencialmente ligada ao processo da decisão racional. Mas penso que isso é só parcialmente verdadeiro. De facto, ponderar razões é apenas um caso muito especial da experiência que nos fornece a convicção da liberdade. A experiência característica que nos dá a convicção da liberdade humana, e é uma experiência da qual somos incapazes de arrancar a convicção da liberdade, é a experiência de nos empenharmos em acções humanas voluntárias e intencionais. Na nossa discussão da intencionalidade, concentrámo-nos naquela forma de intencionalidade que consistia em intenções conscientes na acção, intencionalidade que é causal da maneira como a descrevi, e cujas condições de satisfação são que certos movimentos corporais ocorram e que ocorram como causados por aquela genuína intenção na acção. É esta experiência a pedra basilar da nossa crença na liberdade da vontade. Porquê? Reflictamos com todo o cuidado no carácter das experiências que temos, quando nos empenhamos nas acções humanas normais da vida de cada dia. Veremos a possibilidade de cursos alternativos de acção incrustados nessas experiências. Levantemos o braço ou, atravessemos a rua, ou bebamos um copo de água e veremos que em qualquer ponto da experiência teremos um sentido de cursos alternativos de acção para nós disponíveis.



Se alguém tentar expressar em palavras a diferença entre a experiência de percepcionar e a experiência de agir é que, na percepção, se tem esta sensação: «Isto está a acontecer-me», e, na acção, a sensação é a seguinte: «Faço isto acontecer.» Mas a sensação de que «faço isto acontecer» traz consigo a sensação de que «poderia fazer alguma coisa mais». No comportamento normal, cada coisa que fazemos suscita a convicção válida ou inválida de que poderíamos fazer alguma coisa mais, aqui e agora, isto é, permanecendo idênticas todas as outras condições. Eis, permito-me afirmar, a fonte da nossa inabalável convicção na nossa vontade livre. É talvez importante salientar que estou a discutir a acção humana normal. Se alguém está a braços com uma grande paixão, se alguém se encontra numa cólera imensa, por exemplo, perde esse sentido da liberdade e pode mesmo surpreender-se ao descobrir o que está a fazer.



Desde que atentemos nesta característica da experiência do agir, muitos dos fenómenos intrigantes que antes mencionei facilmente se explicam. Por que é que, por exemplo, o homem no caso da sugestão pós-hipnótica não está a agir livremente no sentido em que nós somos livres, mesmo que ele possa pensar que está a agir livremente? A razão é que, num sentido importante, ele não sabe o que está a fazer. A sua efectiva intenção na acção é totalmente inconsciente. As opções que ele vê disponíveis para si são irrelevantes para a motivação efectiva da sua acção. Note-se também que os exemplos compatibilistas do comportamento «forçado» implicam ainda, em muitos casos, a experiência da liberdade. Se alguém me diz para fazer algo apontando-me uma arma, mesmo em tal caso eu tenho uma experiência que tem o sentido dos cursos alternativos da acção nela incrustados. Se, por exemplo, recebo ordens para atravessar a rua com a arma a mim apontada, parte ainda da experiência é que eu sinto que literalmente me é facultado em qualquer passo fazer alguma coisa mais. Assim, a experiência da liberdade é uma componente essencial de qualquer caso do agir com uma intenção. Assim, a experiência da liberdade é uma componente essencial de qualquer caso do agir com uma intenção.



Mais uma vez, podemos ver isto se contrastarmos o caso normal da acção com os casos da Penfield, onde a estimulação do córtex motor produz um movimento involuntário do braço ou da perna. Em tal caso, o paciente experimenta o movimento passivamente, como experimentaríamos um som ou uma sensação de dor. Diversamente das acções intencionais, aqui não há opções inseridas na experiência. Para vermos com clareza este ponto, tentemos imaginar que uma parte da nossa vida se assemelhava às experiências de Penfield em grande escala. Em vez de caminharmos pela sala, sentiríamos simplesmente que o nosso corpo se move através da sala; em vez de falarmos, simplesmente ouviríamos e sentiríamos que saem da nossa boca. Imaginemos que as nossas experiências são as de uma boneca puramente passiva, mas consciente, teremos imaginado a remoção da experiência da liberdade. Mas, no caso típico da acção intencional, não existe modo algum de erradicarmos a experiência da liberdade. Ela é uma parte essencial da experiência do agir.



Isto explica também, creio eu, porque é que não podemos abandonar a nossa convicção de liberdade. Achamos fácil abandonar a convicção de que a Terra é chata, logo que compreendemos a prova para a teoria heliocêntrica do sistema solar. De modo semelhante, quando olhamos para o pôr do Sol, apesar das aparências, não nos sentimos compelidos a crer que o Sol está a pôr-se por detrás da Terra. Cremos que a aparência do pôr do Sol é simplesmente uma ilusão criada pela rotação da Terra. Em cada caso, é possível abandonar uma convicção de sentido comum, porque a hipótese que a substitui explica as experiências que levaram a essa convicção em primeiro lugar e explica igualmente um vasto conjunto de outros factos que a concepção de senso comum é incapaz de explanar. Eis porque deixámos de lado a crença numa terra chata e o «pôr do Sol» literal em favor da concepção copernicana do sistema solar. Mas não podemos de modo semelhante abandonar a convicção de liberdade, porque esta convicção está inserida em toda a acção intencional normal e consciente. E usamos esta convicção para identificarmos e explicarmos as acções. Esse sentido de liberdade não é apenas uma característica de deliberação, mas é parte de qualquer acção, seja premeditada ou espontânea. O ponto nuclear nada tem essencialmente a ver com a deliberação. A deliberação é apenas um caso especial.



Não navegamos na Terra com base na suposição numa terra chata, mesmo se a Terra parece chata, mas agimos no pressuposto da liberdade. Efectivamente, não podemos agir de outra maneira senão com base na suposição da liberdade, pouco importando o que aprendemos acerca do modo como o Mundo funciona enquanto sistema físico determinado.



Podemos agora tirar as conclusões que estão implícitas nesta discussão. Primeiro se a preocupação a propósito do determinismo é uma preocupação por que todo o nosso comportamento é de facto psicologicamente compulsivo, então, parece que tal preocupação é injustificável. Na medida em que o determinismo psicológico é uma hipótese empírica como qualquer outra, então as provas que presentemente temos disponíveis sugere que ela é falsa. Assim, isto fornece-nos uma forma modificada de compatibilismo. Fornece-nos a convicção de que o libertarismo psicológico é compatível com o determinismo físico.



Em segundo lugar, fornece-nos mesmo um sentido do «poderia ter» em que o comportamento das pessoas, embora determinado, é tal que nesse sentido elas poderiam ter agido de outra maneira: o sentido é simplesmente que, tanto quanto aos factores psicológicos diz respeito, elas poderiam ter agido de outra maneira. As noções de capacidade, do que somos capazes de fazer e do que poderíamos ter feito, são muitas vezes relativas a algum conjunto semelhante de critérios. Por exemplo, eu poderia ter votado em Carter nas eleições americanas em 1980, mesmo se o não fiz; mas não poderia ter votado em George Washington. Ele não foi um candidato. Assim, há um sentido do «poderia ter», em que há para mim disponível um conjunto de escolhas e nesse sentido há muitas coisas que eu poderia ter feito, permanecendo iguais todas as outras coisas que eu não fiz. De modo semelhante, porque os factores psicológicos que operam em mim nem sempre ou mesmo em geral, não me impelem a comportar-me de uma maneira particular, muitas vezes eu, falando em termos psicológicos poderia ter feito algo de diferente daquilo que efectivamente fiz.



Mas, em terceiro lugar, esta forma de compatibilismo ainda não nos fornece nada que se assemelhe à resolução do conflito entre liberdade e determinismo, que o nosso impulso para o libertarismo radical efectivamente exige. Enquanto aceitarmos a concepção de pernas para o ar da explicação física, e é uma concepção em que se baseiam os trezentos anos passados da ciência, então os factos acerca de nós, como quaisquer outros factos de níveis superiores, são inteiramente e causalmente explicáveis em termos de e inteiramente realizáveis em sistemas de elementos ao nível microfísico fundamental. A nossa concepção da realidade física não oferece espaço à liberdade radical.



Em quarto e ultimo lugar, por razões que efectivamente não compreendo, a evolução deu-nos uma forma de experiência da acção voluntária onde a experiência da liberdade, isto é, a experiência do sentido de possibilidades alternativas, está inserida na genuína estrutura do comportamento humano consciente, voluntário e intencional. Por essa razão, creio, nem esta discussão nem qualquer outra alguma vez nos convencerá de que o nosso comportamento não é livre.



O meu objectivo neste livro foi tentar caracterizar as relações entre a concepção que temos de nós mesmos como agentes racionais, livres, conscientes, atentos, e uma concepção que temos do Mundo como consistindo de partículas físicas sem mente, sem significado. É tentador pensar que, assim como descobrimos que largas porções do sentido comum não representam adequadamente o modo como o Mundo realmente funciona, assim poderíamos descobrir que a concepção de nós mesmos e do nosso comportamento é inteiramente falsa. Mas há limites para esta possibilidade. A distinção entre realidade e aparência não pode aplicar-se à genuína existência da consciência, pois, se aparentemente sou consciente, sou consciente. Poderemos descobrir toda a espécie de coisas surpreendentes acerca de nós mesmos e do nosso comportamento; mas não podemos descobrir que não temos mentes, que elas não contêm estados mentais conscientes, subjectivos, intencionalísticos; nem poderíamos descobrir que não tentamos, pelo menos, empenharmo-nos em acções voluntárias, livres e intencionais. O problema que a mim mesmo pus não foi provar a existência dessas coisas, mas examinar o seu estatuto e as suas implicações para as nossas concepções do resto da natureza. O meu tema geral foi que, com certas excepções importantes, a concepção mentalística de sentido comum de nós mesmos é perfeitamente consistente com a nossa concepção da natureza enquanto sistema físico.

Jonh Searle, Mente Cérebro e Ciência