segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

Texto para resumo Luís 10I


 “Sempre que possível, Maria irá fazer qualquer coisa diferente daquela que se espera. Se está a decidir se vai de férias na próxima semana e lhe apontarmos todas as razões para o que o faça, incluindo que irá de férias, bem, Maria vai perversamente ficar em casa. ‘Maria, com certeza deves querer tomar uma bebida fresca, está um dia tão quente!’. Qual quê, é bem capaz que vá para um chá a ferver. (...) Maria gosta de ser do contra, para lhe mostrar a si, e a nós, que é livre. Ela é livre de fazer o que quer, por mais irracional que seja. Acha que agir irracionalmente mostra que, ao contrário dos temporizadores, termóstatos e máquinas de fazer chá, possui livre-arbítrio.
Para que possa fazer o contrário propositadamente, Maria precisa que lhe diga o que prevê. Se previr que vai agir de uma forma, e lho disser, ela vai fazer o oposto. (...)
Muitos filósofos (...) acreditam que os nossos atos acabam por ser causados e determinados por fatores externos. (...) Estes fatores incluem as nossas características genéticas, o condicionamento próprio do nosso crescimento, a cultura na qual vivemos – e impactes diretos do ambiente sobre os nossos sentidos. De uma forma ou de outra, suscitam os nossos desejos, o que dizemos, os nossos movimentos e muito mais; por isso, é extremamente difícil encontrar algum espaço para aquilo que é costume pensar-se como livre-arbítrio ou liberdade de escolha. Em resumo, o que fazemos é determinado pela nossa natureza e criação, nenhuma das qual sendo escolhida por nós.
Um pouco mais detalhadamente, as ações de Maria – os movimentos que ela faz, as palavras que profere – são causadas por alterações eletromecânicas no seu cérebro, que por sua vez são causadas por outras alterações eletromecânicas e impactes através dos sentidos e por aí fora. Se os cientistas soubessem tudo sobre os genes, a maneira como os cérebros funcionam e como são afetados pelo ambiente e sobre as circunstâncias específicas de Maria, eles prediriam tudo o que Maria, mesmo Maria no modo contrário, faria. (...) Isto poderia parecer demonstrar que Maria não é livre e, de facto, não o é, quer alguém se dê ou não ao trabalho de fazer previsões.
Mas.. mas.. mas.. Será que não se mantém a seguinte possibilidade? Se os cientistas fizessem as suas previsões e se Maria soubesse o que eles previam, não era livre para decidir não o fazer? Se eles previam que ia escolher o vestido vermelho, ela podia optar por tornar a previsão deles falsa. Escolhia o azul.”

Peter Cave (2008). Duas vidas valem mais que uma? Academia do Livro, pp. 73-75.


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