terça-feira, 2 de março de 2021

Resumo de texto João Secundo


A civilidade é uma questão de costumes, etiqueta, urbanidade, ritos informais que facilitam as nossas interações e, dessa forma, nos fornecem modos de nos tratarmos mutuamente com consideração. Cria espaço social e psicológico para as pessoas viverem as suas vidas e fazerem as suas escolhas. Os jovens que cospem para o passeio e praguejam nos autocarros revelam sintomas meramente superficiais de incivilidade. Mais grave é a violação da privacidade por parte dos jornais sensacionalistas e as incursões em áreas da vida pessoal irrelevantes para as questões públicas - por exemplo, revelações acerca da vida sexual dos políticos. A nossa época é, efetivamente, moralista. Nauseantemente moralista. E isso constitui grande parte do problema, uma vez que as atitudes moralistas são intolerantes, e a intolerância é uma das piores descortesias. Exigir a cortesia é, de certa forma, exigir muito pouco: "Devemos ser corteses com um homem da mesma forma  como o somos com um quadro, ao qual estamos dispostos a conceder o benefício de uma boa luz", dizia Emerson.

A perda de civilidade significa que o sentimento social foi substituído pela defensiva, com os grupos a reunir-se em torno de conceitos de identidade nacionalista, étnica e religiosa, erigindo barreiras contra os outros e, assim protegendo-se a si mesmos. A sociedade fragmenta-se em subgrupos cujos membros esperam assim escudar-se do egoísmo e desconsideração cáusticos dos outros.

"Há uma cortesia do coração que possui um carácter semelhante ao amor. Dela nasce a cortesia mais pura, no comportamento exterior", disse Goethe. Refere-se aqui um ideal: ignora-se o facto da civilidade poder claro está, ser uma máscara - sempre se prestou a abusos e, mesmo que reaprendêssemos as boas maneiras, continuaria a prestar-se. mas isto não altera o ponto principal:  a civilidade promove uma sociedade que se comporta bem em relação a si mesma, cujos membros respeitam o valor intrínseco do indivíduo e os direitos das pessoas diferentes de si.

As pessoas sem maneiras são geralmente assim porque calculam erradamente o seu valor, pensando que um empregado ( que provavelmente é um estudante de medicina a ganhar um dinheiro extra) ou um motorista de autocarro ( que provavelmente está a escrever nos seus tempos livres o seu próximo romance que irá ganhar prémios) devem ser avaliados pela sua ocupação - ou,mais precisamente, pelos seus rendimentos, que nestes casos, se pode  presumir serem modestos - e não pela sua humanidade.

A.C. Grayling, O Significado das coisas, Gradiva,Lx, 2002, pp.28,29 

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