terça-feira, 7 de janeiro de 2020

Texto para resumo José Caldeira -10A e Madalena Moura -10B


Se existem ou não ações não é algo que possamos responder através da observação direta. Aqueles que duvidam da existência de ações não estão a questionar aquilo que todos percebem. Estão a questionar o facto de saber se os conceitos que habitualmente usamos para descrever e interpretar essas observações são apropriados ou até consistentes. Se não são, leva-nos a uma resposta negativa à nossa questão: se ação é um conceito inconsistente, não pode haver ações, do mesmo modo que não pode haver círculos quadrados. Logo, a própria análise do conceito de ação é um tópico central da filosofia da ação.
Suspeitas acerca da própria consistência do conceito de ação, bem como acerca da distinção entre ações e acontecimentos, podem aparecer mesmo ao nível das perspetivas científicas. Se levamos a ciência a sério, então somos obrigados a refletir sobre a possibilidade de reconciliar a visão científica com a conceção comum da realidade, já que elas parecem ser, se não contraditórias, pelo menos altamente díspares. As perspetivas científicas congratulam-se com acontecimentos explicados por outros acontecimentos anteriores ou por outros acontecimentos simultâneos com a ajuda de leis. Mas se pensarmos em nós como agentes, concebemo-nos como seres capazes de iniciar alterações no mundo independentemente da sua história prévia. Agentes e ações, então, enfrentarão dificuldades se procurarem um lugar no plano científico.
A atitude de suspeição ou de ceticismo relativamente à ação apresenta-se de formas diversas, desde propostas eliminativistas até propostas mais ou menos reducionistas. Para que o leitor fique com uma ideia do que possa ser uma atitude reducionista, comecemos com um episódio que ninguém hesitaria classificar como ação: beber um copo de água. Que direito temos de chamar isto de ação e não apenas de acontecimento? Onde reside o carácter adicional deste episódio? O que fiz eu? A água entra na minha boca como efeito da gravidade. Este movimento, por sua vez, foi provocado pelo movimento do copo. Onde está a ação aqui? Bem, alguém pode sempre dizer que se causei o acontecimento, então agi. Mas pense que este movimento pode ser exatamente causado pelo movimento da minha mão e do meu braço, que por sua vez foram causados por alguns movimentos de contração dos músculos, que por sua vez foram provocados por alguns disparos neuronais, e assim sucessivamente. Uma ação assim parece dissolver-se e reduzir-se a uma sequência de acontecimentos. A nossa distinção vulgar entre ações e acontecimentos começa a desvanecer-se; parece que chamamos "ação" ao que na realidade não é mais do que uma série de eventos causalmente relacionados. Apelar para desejos não resolve a questão, já que o nosso desejo por água é provavelmente um estado causado por privação orgânica. A cadeia de eventos estende-se cada vez mais no passado e parece nada haver que nós, como agentes, tenhamos iniciado, nenhuma ação, só sempre mais e mais acontecimentos. Então as ações parecem não ser outra coisa senão sequências específicas de acontecimentos.

Carlos J. Moya, The Philosophy of Action (Polity Press, Oxford, 1990), pp. 1–2.

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