Ainda se pode objetar que a retórica só é útil para aqueles
que querem enganar o público e ocultar os seus objetivos reais, já que alguém
que apenas quer comunicar a verdade pode ser direto e não precisará de
ferramentas retóricas. Isso, no entanto, não é o ponto de vista de Aristóteles:
mesmo aqueles que apenas tentam estabelecer o que é justo e verdadeiro precisam
da ajuda da retórica quando enfrentam uma audiência pública. Aristóteles
diz-nos que é impossível ensinar essa audiência, mesmo que o falante tenha o
conhecimento exato do assunto. Obviamente, Aristóteles considera que a
audiência de um discurso público consiste em pessoas comuns que não conseguem
seguir uma prova exata baseada nos princípios de uma ciência. Além disso, essa
audiência pode ser facilmente distraída por fatores que não pertencem ao
assunto; às vezes são recetivos a lisonjas ou apenas tentam estar em vantagem.
Esta situação torna-se ainda pior se a constituição, as leis e os hábitos
retóricos de uma cidade forem maus. Finalmente, a maioria dos tópicos que
geralmente são discutidos em discursos públicos não permitem conhecimento
exato, mas deixam espaço para dúvidas; especialmente em tais casos, é
importante que o orador pareça ser uma pessoa credível e que o público esteja
num clima de simpatia. Por todas essas razões, afetar as decisões de jurados e
assembleias é uma questão de persuasão e não de conhecimento. É verdade que
algumas pessoas conseguem ser persuasivas, seja ao acaso ou por hábito, mas é a
retórica que nos dá um método para descobrir todos os meios de persuasão em
qualquer assunto.
Aristotle's Rhetoric Article First published
Thu May 2, 2002; substantive revision Mon Feb 1, 2010
Stanford
Encyclopedia of Philosophy
A retórica é útil porque as coisas que são verdadeiras e as
coisas que são justas têm uma tendência natural para prevalecer sobre os seus
opostos. Assim, se as decisões dos juízes não forem aquelas que deveriam ser, a
derrota tem de ser atribuída aos próprios oradores e por isso eles têm de ser
censurados.
Além disso, nem mesmo a posse do conhecimento mais exato
torna fácil convencer certos auditórios daquilo que dizemos, pois a
argumentação baseada no conhecimento implica a instrução e existem pessoas que
não conseguiremos instruir. Nestes casos, temos de usar, então, noções que
todos possuem enquanto modo de persuasão e argumentação. (...)
Além do mais, temos de ser capazes de utilizar a persuasão
(tal como o raciocínio rigoroso pode ser utilizado) em lados opostos de uma
questão - não para que na prática possamos utilizá-la de ambas as maneiras,
pois não devemos levar as pessoas a acreditar naquilo que é errado, mas
podermos ver claramente os factos e para que, se outro homem argumentar
desonestamente, possamos refutá-lo. Em nenhuma das outras artes se retiram
conclusões opostas: isto só acontece na dialética e na retórica. Estas duas
artes retiram conclusões opostas imparcialmente. Ainda assim, os factos
subjacentes não se prestam igualmente bem às perspetivas contrárias. Não, na
prática, as coisas que são verdadeiras e as coisas que são melhores são, pela
sua natureza, mais fáceis de acreditar e de provar.
Por fim, é absurdo sustentar que um homem deve ter vergonha
de ser incapaz de se defender com os seus membros, mas não ser incapaz de se
defender com o discurso e a razão.
Aristóteles, Retórica
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