Rawls debruçou-se sobre um dos mais
espinhosos dilemas da sociedade democrática: como conciliar direitos iguais
numa sociedade desigual, como harmonizar as ambições materiais dos mais
talentosos com os anseios dos menos
favorecidos em melhorar a sua vida e posição na sociedade? Tratou-se de um esforço
intelectual para conciliar a Meritocracia
com a ideia da Igualdade.
A resposta que Rawls encontrou para
resolver essas antinomias e posições conflituantes fez história. Nem a
social-democracia europeia, velha demais de século e meio, adotando sempre um
política social pragmática, havia encontrado uma solução teórica-jurídica para
tal desafio. Habermas, o maior filósofo alemão do pós-guerra, considerou o
livro de Rawls, um marco na história do pensamento, um turning point na
teoria social moderna, abrindo caminho para a aceitação dos direitos das
minorias e para a política da Affirmative Action , a ação
positiva. Política de compensação social adotada em muitos estados dos Estados
Unidos desde então, que visa ampliar e facilitar as possibilidades de ascensão
aos empregos públicos e aos assentos universitários por parte daquelas minorias
étnicas que deles tinham sido, até então, rejeitadas ou excluídas. Cumpre-se
dessa forma a sua meta de maximize the welfare of society's worse-off
member, de fazer com que a sociedade do Bem-estar fosse maximizada em
função dos que estão na pior situação, garantindo que a extensão dos direitos
de cada um fosse o mais amplamente estendido, desde que compatível com a
liberdade do outro.
A
sociedade justa
De certo modo Rawls retoma, no quadro do
liberalismo social de hoje, a discussão ocorrida nos tempos da Grécia Antiga,
no século V a.C., registrada na "República" , de Platão. Ocasião em
que, pela primeira vez, se debateu quais
seriam os fundamentos de uma sociedade justa. Para o filósofo americano os seus
dois pressupostos são:
1) igualdade de oportunidades abertas a
todos em condições de plena equidade.
2)
os benefícios nela auferidos devem ser repassados preferencialmente aos membros
menos privilegiados da sociedade, os worst off, satisfazendo as
expectativas deles, porque a justiça social é, antes de tudo, amparar os
desvalidos. Para conseguir-se isso é preciso, todavia, que uma dupla operação
ocorra. Os better off, os talentosos, os melhor dotados (por
nascimento, herança ou dom), devem aceitar com benevolência em ver diminuir sua
participação material (em bens, salários, lucros e status social), minimizadas
em favor do outros, dos desassistidos. Esses, por sua vez, podem assim ampliar
seus horizontes e suas esperanças em dias melhores, maximizando as suas
expectativas.
Para que isso seja realizável numa moderna
democracia de modelo representativo é pertinente concordar inclusive que os
representantes dos menos favorecidos (partidos populares, lideranças sindicais,
minorias étnicas, certos grupos religiosos, e demais excluídos, etc..), sejam
contemplados no jogo político com a ampliação da sua representação, mesmo que
em detrimento momentâneo da representação da maioria. Rawls aqui introduz o
principio ético do altruísmo a ser exigido ou cobrado aos mais talentosos e
beneficiados - a abdicação consciente de certos privilégios e vantagens
materiais legítimas em favor dos socialmente menos favorecidos.
Há nisso uma clara evocação, de origem
calvinista, à limitação dos " direitos do talento", sem a qual ele
considera difícil senão impossível por em prática a equidade. Especialmente
quando se lembra que uma sociedade materialmente rica não significa
necessariamente que ela é justa. Organizações sociais modestas, lembrou ele, podem
apresentar um padrão de justiça bem maior do que se encontra nas sociedades
opulentas.
Voltaire Schilling, retirado daqui
Voltaire Schilling, retirado daqui
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