Vivienne Westwood
" As questões sobre os valores - isto é, sobre o
que é bom ou mau em si, independentemente dos seus efeitos estão fora do
domínio da ciência, como os defensores da religião afirmam
veementemente. Eu penso que nisto têm razão, mas retiro outra conclusão
que eles não retiram - a de que as questões sobre "valores" estão
completamente fora do domínio do conhecimento. Por outras palavras,
quando afirmamos que isto ou aquilo tem "valor", estamos a exprimir as
nossas emoções, e não a indicar algo que seria verdadeiro mesmo que os
nossos sentimentos pessoais fossem diferentes. (...)
Qualquer
tentativa de persuadir as pessoas de que algo é bom (ou mau) em si, e
não apenas por causa dos seus efeitos, depende não de qualquer recurso a
provas, mas da arte de suscitar sentimentos. O talento do pregador
consiste em criar nos outros emoções semelhantes às suas - ou
diferentes, se ele for hipócrita. Ao dizer isto não estou a criticar o
pregador, mas a analisar o carácter essencial da sua actividade.
Quando
um homem diz "Isto é bom em si" parece estar a exprimir uma proposição
como se tivesse dito "Isto é um quadrado" ou "Isto é doce". Julgo que
isto é um erro. Penso que aquilo que o homem quer realmente dizer é
"Quero que toda a gente deseje isto", ou melhor, "Quem me dera que toda a
gente desejasse isto". Se aquilo que ele diz for interpretado como uma
proposição, esta é apenas sobre o seu desejo pessoal. Se for antes
interpretado num sentido geral, nada afirma, exprimindo apenas um
desejo. O desejo, enquanto acontecimento, é pessoal, mas o que se deseja
é universal. Penso que foi este curioso entrelaçamento entre o
particular e o universal que provocou tanta confusão na Ética. (...)
Se
esta análise está correcta, a ética não contém quaisquer proposições,
sejam elas verdadeiras ou falsas, consistindo em desejos gerais de uma
certa espécie, nomeadamente naqueles que dizem respeito aos desejos da
humanidade em geral - e dos deuses, dos anjos e dos demónios, se eles
existirem. A ciência pode discutir as causas dos desejos e os meios para
os realizar, mas não contém quaisquer frases genuinamente éticas, pois
esta diz respeito ao que é verdadeiro ou falso.
A
teoria que estou a defender é uma forma daquela que é conhecida por
doutrina da "subjectividade" dos valores. Esta doutrina consiste em
sustentar que, se dois homens discordam quanto a valores, há uma
diferença de gosto, mas não um desacordo quanto a qualquer género de
verdade. Quando um homem diz "As ostras são boas" e outro diz "Eu acho
que são más" , reconhecemos que nada há para discutir. A teoria em
questão sustenta que todas as divergências de valores são deste género,
embora pensemos naturalmente que não o são quando estamos a lidar com
questões que nos parecem mais importantes que as das ostras. A razão
principal para adoptar esta perspectiva é a completa impossibilidade de
encontrar quaisquer argumentos que provem que isto ou aquilo tem valor
intrínseco. Se estivéssemos de acordo a este respeito, poderíamos
defender que conhecemos os valores por intuição. Não podemos provar a um
daltónico que a relva é verde e não vermelha, mas há várias maneiras de
lhe provar que ele não tem um poder de discriminação que a maior parte
dos homens tem. No entanto, no caso dos valores não há qualquer maneira
de fazer isso, e aí os desacordos são muito mais frequentes que no caso
das cores. Como não se pode sequer imaginar uma maneira de resolver uma
divergência a respeito de valores, temos de chegar à conclusão de que a
divergência é apenas de gostos e não se dá ao nível de qualquer verdade
objectiva.
Bertrand Russell, Ciência e Ética, 1935. Tradução de Paula Mateus
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