quinta-feira, 6 de março de 2025

TEXTO PARA RESUMO Inês Nascimento 10A e Joana Antunes 10E


TEXTOS FUNDAMENTAIS 2 - Os valores são subjetivos ou objetivos?


" As questões sobre os valores - isto é, sobre o que é bom ou mau em si, independentemente dos seus efeitos estão fora do domínio da ciência, como os defensores da religião afirmam veementemente. Eu penso que nisto têm razão, mas retiro outra conclusão que eles não retiram - a de que as questões sobre "valores" estão completamente fora do domínio do conhecimento. Por outras palavras, quando afirmamos que isto ou aquilo tem "valor", estamos a exprimir as nossas emoções, e não a indicar algo que seria verdadeiro mesmo que os nossos sentimentos pessoais fossem diferentes. (...)


Qualquer tentativa de persuadir as pessoas de que algo é bom (ou mau) em si, e não apenas por causa dos seus efeitos, depende não de qualquer recurso a provas, mas da arte de suscitar sentimentos. O talento do pregador consiste em criar nos outros emoções semelhantes às suas - ou diferentes, se ele for hipócrita. Ao dizer isto não estou a criticar o pregador, mas a analisar o carácter essencial da sua atividade.


Quando um homem diz "Isto é bom em si" parece estar a exprimir uma proposição como se tivesse dito "Isto é um quadrado" ou "Isto é doce". Julgo que isto é um erro. Penso que aquilo que o homem quer realmente dizer é "Quero que toda a gente deseje isto", ou melhor, "Quem me dera que toda a gente desejasse isto". Se aquilo que ele diz for interpretado como uma proposição, esta é apenas sobre o seu desejo pessoal. Se for antes interpretado num sentido geral, nada afirma, exprimindo apenas um desejo. O desejo, enquanto acontecimento, é pessoal, mas o que se deseja é universal. Penso que foi este curioso entrelaçamento entre o particular e o universal que provocou tanta confusão na Ética. (...)


Se esta análise está correta, a ética não contém quaisquer proposições, sejam elas verdadeiras ou falsas, consistindo em desejos gerais de uma certa espécie, nomeadamente naqueles que dizem respeito aos desejos da humanidade em geral - e dos deuses, dos anjos e dos demónios, se eles existirem. A ciência pode discutir as causas dos desejos e os meios para os realizar, mas não contém quaisquer frases genuinamente éticas, pois esta diz respeito ao que é verdadeiro ou falso.


A teoria que estou a defender é uma forma daquela que é conhecida por doutrina da "subjetividade" dos valores. Esta doutrina consiste em sustentar que, se dois homens discordam quanto a valores, há uma diferença de gosto, mas não um desacordo quanto a qualquer género de verdade. Quando um homem diz "As ostras são boas" e outro diz "Eu acho que são más" , reconhecemos que nada há para discutir. A teoria em questão sustenta que todas as divergências de valores são deste género, embora pensemos naturalmente que não o são quando estamos a lidar com questões que nos parecem mais importantes que as das ostras. A razão principal para adotar esta perspetiva é a completa impossibilidade de encontrar quaisquer argumentos que provem que isto ou aquilo tem valor intrínseco. Se estivéssemos de acordo a este respeito, poderíamos defender que conhecemos os valores por intuição. Não podemos provar a um daltónico que a relva é verde e não vermelha, mas há várias maneiras de lhe provar que ele não tem um poder de discriminação que a maior parte dos homens tem. No entanto, no caso dos valores não há qualquer maneira de fazer isso, e aí os desacordos são muito mais frequentes que no caso das cores. Como não se pode sequer imaginar uma maneira de resolver uma divergência a respeito de valores, temos de chegar à conclusão de que a divergência é apenas de gostos e não se dá ao nível de qualquer verdade objetiva.

Bertrand Russell, Ciência e Ética, 1935. Tradução de Paula Mateus

terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

Texto para resumo Gui 10A



Quando o exército nazi invadiu a Polónia em Setembro de 1939, iniciando, com isso, a Segunda Guerra Mundial, foi uma ação intolerante de primeira ordem. Mase se ela se conformasse aos ideais nazis? Um relativista cultural, parece, não poderia criticar os nazis por serem intolerantes, se tudo o que eles estão a fazer é seguir o seu próprio código moral. Entendido com propriedade, o relativismo cultural sustenta que as normas de uma cultura reinam supremas dentro dos limites da cultura. Assim, uma vez que os soldados alemães entraram na sociedade polaca, eles tornaram-se sujeitos às normas da sociedade polaca – normas que, obviamente, excluíam a carnificina de polacos inocentes. Como afirma o velho ditado, “em Roma, como os romanos”. Relativistas culturais concordariam com esta posição.
O ARGUMENTO DA DIFERENÇA CULTURAL
Os relativistas culturais frequentemente empregam uma certa forma de argumento. Eles começam com fatos sobre as culturas e terminam extraindo uma conclusão sobre a moralidade. Assim,  convidam-nos a aceitar este raciocínio:
1. Os gregos acreditavam que era errado comer os mortos, ao passo que os galatianos acreditavam que era correto comer os mortos.
2. Portanto, comer os mortos não é nem objetivamente certo nem objetivamente errado. É meramente uma questão de opinião que varia de uma cultura para outra.
Ou:1. Os esquimós não viam nada de errado com o infanticídio, ao passo que os americanos acreditam que ele é imoral.2. Portanto, o infanticídio não é nem objetivamente certo nem objetivamente errado. É meramente uma questão de opinião que varia de uma cultura para outra. Claramente, esses argumentos são variações de uma ideia fundamental. Eles são exemplos de um argumento mais geral que diz:1. Culturas diferentes têm códigos morais diferentes.2. Portanto, não há verdade objetiva na moralidade. Certo e errado são somente questões de opinião, e opiniões variam de uma cultura para outra. Podemos chamar isso de argumento da diferença cultural. Para muitas pessoas ele é persuasivo. Mas é ele um bom argumento – é sólido? Não,  não é. Para um argumento ser sólido, as suas premissas têm de ser verdadeiras e a conclusão tem que se seguir logicamente delas. Aqui, o problema é que a conclusão não se segue das premissas – isto é, mesmo que a premissa seja verdadeira, a conclusão ainda assim pode ser falsa. A premissa concerne àquilo em que as pessoas acreditam – em algumas sociedades as pessoas acreditam numa coisa; em outras sociedades as pessoas acreditam noutra outra coisa. A conclusão, portanto, concerne ao que é realmente o caso. Esse tipo de conclusão não se segue logicamente daquele tipo de premissa. Na terminologia filosófica, isso significa que o argumento é inválido. Considere novamente o exemplo dos gregos e dos galatianos.  Os gregos acreditavam que era errado comer os mortos; os galatianos acreditavam que era certo. Do mero fato de que eles discordavam, segue-se que não há verdade objetiva em relação àquela matéria? Não, não se segue; poderia ser que a prática fosse objetivamente certa (ou errada) e que um deles estivesse simplesmente enganado. Para tornar o ponto claro, considere uma questão diferente. Em algumas sociedades, as pessoas acreditam que a terra é plana. Em outras sociedades, como na nossa, as pessoas acreditam que a terra é esférica. Do mero fato de as pessoas discordarem, segue-se que não há “verdade objetiva” na geografia? Claro que não; nós nunca tiraríamos tal conclusão, isso porque entendemos que os membros de uma sociedade podem simplesmente estar errados. Não há razão para pensar que, se o mundo é redondo, todo mundo tenha que conhecer isso. Similarmente, não há razão para pensar que, se há verdade moral, todo mundo tenha que conhecê-la. O argumento da diferença cultural tenta derivar uma conclusão substantiva sobre um assunto a partir do mero fato de que as pessoas discordam. Mas isso é impossível.

James Rachels, Elementos de filosofia moral

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Texto para resumo Duarte Leal 10E





(Foto de Dora Maar, 1907/1997)

A filosofia adota uma atitude crítica em relação a determinadas crenças que foram previamente consideradas verdadeiras. A filosofia moral faz o mesmo em relação a crenças relacionadas com o certo e o errado, com o bom e o mau, com o que se deve e com o que não se deve fazer. A questionação crítica de determinadas crenças tende a surgir quando existe um conflito aparente entre uma ideia antiga e uma nova. Eis dois exemplos: Na Grécia antiga, como em muitas outras sociedades, aceitava-se que as regras morais eram absolutas e refletiam a ordem do universo como um todo. Quando os professores itinerantes, os chamados “sofistas”, viajaram pelo mundo conhecido, descobriram que os códigos morais e os sistemas legais variavam de sociedade para sociedade. Isto levou-os a questionar a antiga crença de que as regras morais são absolutas e universais. O mesmo pode acontecer nas sociedades modernas do ocidente. Em geral, aceita-se que certos princípios fundamentais — por exemplo, a proibição de matar pessoas — são absolutos e universalmente reconhecidos como tal. No entanto, é claro que todos sabemos que certas tribos primitivas, e até nações civilizadas em situação de guerra, pensam que a proibição absoluta só se aplica dentro do próprio grupo. Contudo, e pelo menos, dentro desses limites, supomos que o princípio é universalmente aceite como autoevidente. Assim, constitui para nós uma surpresa ver os antropólogos sociais afirmar que em algumas tribos se aprovava a morte das pessoas mais velhas da sua sociedade. Podemos observar diferenças de comportamento e podemos observar indícios a favor de diferentes crenças. Mas se tivermos dúvidas sobre a verdade do nosso próprio código moral, não nos serve de muito confirmar que outras pessoas têm diferentes crenças morais. O nosso problema não é descobrir em que acreditamos nós e em que acreditam os outros. O nosso problema é saber em que devemos acreditar; a questão não é saber o que nós (ou os Samoenses) pensamos que está correto, mas sim o que devemos pensar que está correto [...]. Queremos um teste para normas ou valores e não um teste para factos. (…)
Antes, pensava-se que a Terra era plana. Hoje temos boas razões para acreditar na tese de que a Terra é mais ou menos esférica. Mas que indícios podemos nós fornecer para mostrar que a tese de que matar pessoas idosas ou crianças fracas é realmente errada, apesar das práticas e das crenças de algumas sociedades? No exemplo da Terra plana, uma observação pode ser corrigida por outra. À primeira vista a Terra parece plana; mas depois temos que ter em conta a diferença no horizonte, quando é observado ao nível do mar e quando é observado do topo de uma montanha; temos que ter em conta que o casco de um navio, visto ao longe, desaparece primeiro do que os seus mastros; temos que ter em conta as viagens à volta do mundo; e ainda a visão da Terra quando observada de uma estação lunar. Em relação às crenças morais, que tipo de observação poderia surtir o mesmo efeito? Nós não vemos nem tocamos aquilo que é correto ou aquilo que é errado. Nós não alcançamos as nossas crenças morais a partir dos dados dos sentidos.
Bem, mas talvez as alcancemos através dos dados fornecidos por um tipo diferente de experiência: a experiência do sentimento ou da emoção. Nós temos certos sentimentos de aprovação em relação a certas ações e estados de coisas e temos sentimentos de desaprovação em relação a outras. O mesmo se aplica aos juízos estéticos. Quando afirmamos que a Quinta Sinfonia de Beethoven é bela, ou quando dizemos que o pôr-do-sol é belo, não ouvimos a beleza de um, nem vemos a beleza de outro. Ouvimos os sons da sinfonia e vemos as cores do pôr-do-sol; mas sentimo-nos tocados esteticamente. Do mesmo modo, talvez possamos afirmar que nos sentimos tocados moralmente quando observamos um ato de bondade ou um ato de crueldade.
Esta teoria tem uma implicação importante. Os sentimentos são subjetivos. Os seguintes provérbios são disso prova: “a beleza está nos olhos de quem a vê” (significando a mente, não o olho físico); “gostos não se discutem”; “tu gostas de café, eu gosto de chá”; “os espartanos aprovavam o abandono de crianças débeis, nós desaprovamos”. Assim, a teoria que defende que os juízos morais, tal e qual como os juízos estéticos, dependem dos dados dos sentimentos, tem a consequência de que são subjetivos. I

D. D. Raphael Moral Philosophy (Oxford University Press, 1994), pp. 11–22.




quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Resumo de texto Beatriz Soares 10E e Gabriel Duarte 10A


 Paulo Gonçalves, um dos portugueses que participou no rali Dakar 2016, esteve em grande destaque na sétima etapa, depois de ter parado mais de dez minutos para ajudar Matthias Walkner — um piloto rival — que sofrera um acidente e partiu o fémur. Esta ação poderia ter custado a Paulo Gonçalves a liderança da classificação geral, mas ele não hesitou em parar para ajudar. Mais tarde, escreveria no Facebook:

Fiz aquilo que me competia. […] Não sou um herói, sou um ser humano com respeito pelos outros. A nossa vida vale mais que qualquer vitória, sem ela não vencemos.

O Público, onde li a notícia, refere que Paulo Gonçalves “protagonizou a boa ação do dia na sétima etapa do rali” (Pimentel, 2016).

As nossas ações podem ter várias características. Quando encaradas sob o aspeto pelo qual podem chamar-se boas ou más, têm um valor moral. Ao lermos as declarações de Paulo Gonçalves e a notícia do Público, formamos a crença de que é uma pessoa de valores, ou com valores, querendo com isto dizer que segue bons valores: foi solidário, bondoso e respeitoso com o seu rival. (...)

Mas o que são os valores? Qual é a sua natureza? As coisas têm valor porque as valorizamos, ou valorizamo-las porque têm valor? A axiologia, também chamada filosofia dos valores ou teoria dos valores, procura responder a estas perguntas. A axiologia estuda a natureza dos valores em geral, o significado e as características das afirmações que referem valores (os juízos de valor), analisa a possibilidade de esses juízos serem verdadeiros ou falsos e as condições em que o poderão ser 

Os filósofos discordam em relação ao que sejam os valores (como, de resto, em relação a quase tudo). Uns pensam que os valores são ideias que existem apenas na mente de quem neles pensa, outros pensam que os valores são realidades abstratas com alguma independência dos sujeitos. Uma definição neutra e consensual dos valores apresenta-no-los como “aquilo que nos leva a ter preferência e interesse por algumas coisas, pessoas, ações, situações, etc., e não por outras, e, por isso, a avaliá-las positiva ou negativamente” . Entendidos deste modo, os valores são critérios de ação, orientam as nossas decisões, dão-nos uma linha de rumo:

Permitem avaliar pessoas e situações, e ajudam-nos a classificar as coisas como boas ou más, desejáveis ou indesejáveis, benéficas ou prejudiciais. 

Os valores são diversos. Vão desde as ações cotadas na bolsa — que têm um valor económico — aos mais elevados valores morais, desde o copo de água, capaz de matar a sede, até ao que pensamos que nos ajuda a aproximar-nos de Deus — como a fé. Dada a grande diversidade de valores, é costume agrupá-los em áreas ou domínios. Entre os mais estudados em filosofia, temos os valores éticos, os estéticos e os religiosos. Valores como a bondade, a solidariedade, o respeito, a honestidade, a lealdade, a justiça e a liberdade são valores éticos. Valores como a beleza, a graciosidade, a harmonia e a elegância são valores estéticos. Valores como a fé, o sagrado e a pureza são valores religiosos.


António Padrão

 

terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

sábado, 15 de fevereiro de 2025

Texto para resumo Ana Rita 10E


Terá o mundo contemporâneo, valores?

«No passado, os Homens tinham certezas religiosas e morais. Toda a vida individual e social estava organizada em redor dessas crenças sagradas. Os seus símbolos de pedra, os monumentos religiosos, sobreviveram aos milénios. Tal como as estátuas dos deuses, os livros de inspiração divina. A grande mudança teve lugar com a Revolução Industrial. Então, a pouco e pouco, a banca, a bolsa, o arranha-céus de escritórios substituíram a catedral. Paralelamente à crise do sacro, difunde-se a recusa do conceito de pecado e, eventualmente, do conceito de culpa. As grandes revoluções contemporâneas, a libertação sexual, o feminismo, fizeram desaparecer muitas crenças e muitas normas consideradas imutáveis.

Já não existem tábuas da lei absolutas e imutáveis e muitos pensam, depois de Nietzsche, que os conceitos de bem e de mal se estão a desvanecer, tal como a ideia de demónio e da tentação.

Muitos pensadores laicos constatam que o pensamento progressista triunfa hoje, mas como que despojado de valores. Ensina a não ser fanático, a ser tolerante, racional, mas ao fazê-lo, aceita um pouco de tudo, o consumismo, a superficialidade da moda, o vazio da televisão. Não consegue, sobretudo, fazer despertar nos indivíduos uma chama que vá para além do
mero bem-estar, um ideal que supere o horizonte de uma melhor distribuição dos rendimentos. Não cria metas, não suscita crenças. Não sabe fornecer critérios do bem e do mal, do justo e do injusto. Desta forma, tudo se reduz à opinião e à conveniência pessoais.

Isto é o que os filósofos, os sociólogos e os observadores críticos continuam a dizer do nosso mundo.

E não restam dúvidas de que, em boa medida, as suas observações têm fundamento. Mas, em nosso entender, não tomam em consideração os valores positivos do mundo moderno, a sua moralidade específica.

Partamos da observação de alguns factos. A nossa sociedade tem muitos valores reconhecidos, partilhados, não discutidos. Considera negativamente a violência em todas as suas formas. A nossa sociedade eliminou as formas mais brutais de abuso. Eliminou o duelo, as vinganças privadas. Hoje, a pouco e pouco, está a eliminar os focos de guerra. Combateu a doença e as dores físicas e mentais. Defendeu as crianças, os velhos, os doentes, protegendo-os com uma rede de direitos. Combate os preconceitos raciais, as discriminações étnicas. É certo que estas coisas ainda existem, mas são condenadas e combatidas como nunca o foram no passado. A nossa sociedade favoreceu a ciência, o conhecimento objetivo, difundiu a instrução, procurou estabelecer a equidade social, nivelando as diferenças mais agudas. Tornou-
-nos mais compreensivos das necessidades dos outros, mais civilizados, mais amáveis. Fez com que nos tornássemos mais conscientes em relação à natureza, à vida animal, ao nosso próprio planeta. Também não é verdade que não sintamos o dever. Sentimos como drama e dever a pobreza do Terceiro Mundo. Sabemos que é nosso dever acabar com a miséria, com a fome, com os desgastes provocados pelas doenças. Sabemos que é nosso dever dirigir o progresso técnico para um equilíbrio ecológico que garanta a vida às gerações futuras.

Não nos sentimos, de facto, para além do bem e do mal. Talvez sejamos hipócritas, mas damo-nos conta de que os desastres sociais e naturais são o produto do nosso egoísmo individual e coletivo.»

Francesco Alberoni e Salvatore Veca, O altruísmo e a moral. Lisboa: Bertrand, 1998.


 

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

 A Marta vai publicar o diário de bordo que fez com o 10A.

terça-feira, 14 de janeiro de 2025

Texto para resumo Riana 10A e Margarida Brás 10E

 



“Vou contar-te um caso dramático. Já ouviste falar das térmitas, essas formigas brancas que, em África, constroem formigueiros impressionantes, com vários metros de altura e duros como pedras? Uma vez que o corpo das térmitas é mole, por não ter a couraça de quitina que protege outros insetos, o formigueiro serve-lhes de carapaça coletiva contra certas formigas inimigas, mais bem armadas do que elas. Mas por vezes um dos formigueiros é derrubado, por causa de uma cheia ou de um elefante (os elefantes, que havemos nós de fazer, gostam de coçar os flancos nas termiteiras). A seguir, as térmitas-operário começam a trabalhar para reconstruir a fortaleza afetada, e fazem-no com toda a pressa. Entretanto, já as grandes formigas inimigas se lançam ao assalto. As térmitas-soldado saem em defesa da sua tribo e tentam deter as inimigas. Como nem no tamanho nem no armamento podem competir com elas, penduram-se nas assaltantes tentando travar o mais possível o seu avanço, enquanto as ferozes mandíbulas invasoras as vão despedaçando. As operárias trabalham com toda a velocidade e esforçam-se por fechar de novo a termiteira derrubada… mas fecham-na deixando de fora as pobres e heroicas térmitas-soldado, que sacrificam as suas vidas pela segurança das restantes formigas. Não merecerão estas formigas-soldado pelo menos uma medalha? Não será justo dizer que são valentes? Mudo agora de cenário, mas não de assunto. Na Ilíada, Homero conta a história de Heitor, o melhor guerreiro de Tróia, que espera a pé firme fora das muralhas da sua cidade Aquiles, o enfurecido campeão dos Aqueus, embora sabendo que Aquiles é mais forte do que ele e que vai provavelmente matá-lo. Fá-lo para cumprir o seu dever, que consiste em defender a família e os concidadãos do terrível assaltante. Ninguém dúvida: Heitor é um herói, um homem valente como deve ser. Mas será Heitor heroico e valente da mesma maneira que as térmitas-soldado, cuja gesta milhões de vezes repetida nenhum Homero se deu ao trabalho de contar? Não faz Heitor, afinal de contas, a mesma coisa que qualquer uma das térmitas anónimas? Por que nos parece o seu valor mais autêntico e mais difícil do que o dos insetos? Qual a diferença entre um e outro caso? Muito simplesmente, a diferença assenta no facto de as térmitas-soldado lutarem e morrerem porque têm de o fazer, sem que possam evitá-lo (como a aranha come a mosca). Heitor, pelo seu lado, sai para enfrentar Aquiles porque quer. As térmitas-soldado não podem desertar, nem se revoltar, nem fazer cera para que outras vão em seu lugar: estão programadas necessariamente pela natureza para cumprir a sua heroica missão. O caso de Heitor é distinto. Poderia dizer que está doente ou que não tem vontade de se bater com alguém mais forte do que ele. Talvez os seus concidadãos lhe chamassem cobarde e o considerassem insensível ou talvez lhe perguntassem que outro plano via ele para deter Aquiles, mas é indubitável que Heitor tem a possibilidade de se recusar a ser herói. Por muita pressão que os restantes exercessem sobre ele, ele teria sempre maneira de escapar daquilo que se supõe que deve fazer: não está programado para ser herói, nem o está seja que homem for. Daí que o seu gesto tenha mérito e que Homero nos conte a sua história com uma emoção épica. Ao contrário das térmitas, dizemos que Heitor é livre, e por isso admiramos a sua coragem”.

Fernando Savater, Ética para um Jovem, Editorial Presença, 7ª ed., 2000, pp. 24, 25.